O Legalismo mata a alegria de amar a Deus
Em sua homilia desse 22º Domingo do Tempo Comum, Pe. Rodrigo Hurtado LC reflete sobre como o desvio do legalismo, que atinge especialmente aqueles que já estão caminhando com Jesus, acaba por matar a verdadeira alegria de amar a Deus. Ele também explica o mecanismo do pecado e da impureza, mencionado também por Jesus nesse trecho do Evangelho de S. Marcos.
Jesus tem um novo confronto, dessa vez com os fariseus, que era um grupo de judeus, fiéis observantes das leis herdadas dos antepassados e talvez sejam os que mais se aproximavam dos ensinamentos de Jesus, pois eram fiéis à Torá. Nós assimilamos fariseus a hipócritas, mas eram pessoas estudiosas das escrituras, no entanto, Jesus confronta os fariseus porque eles caíram em uma armadilha muito perigosa, que é o legalismo.
«O legalismo não é uma tentação de quem está longe de Deus. O legalismo é uma tentação das pessoas que estão próximas de Deus, que seguem a Deus com fervor, que são piedosas», mas correm o perigo de cair no legalismo, que é substituir nossa relação com Deus por uma série de normas, regras e rituais. «Não me preocupo tanto com esse contato íntimo, por esse estar em sintonia com o coração de Deus». Ao final, eu resumo tudo em cumprir regras, em cumprir normais e em cumprir rituais.
«Isso é muito perigoso porque ele (o legalismo) produz uma mudança profunda em nossa mente, em nosso coração», explica o Pe. Rodrigo. «Trocamos o foco do que Deus fez por nós, pelo que nós fazemos por Deus». Nós nos sentimos justificados por nossas obras.
Pe. Rodrigo continua sua homilia recordando S. Paulo, um fariseu muito famoso. Ele mesmo conta que era fariseu e que vivia sua fé melhor que ninguém, e ele também caiu na armadilha do legalismo:
“Se alguém julga que tem motivos para confiar na carne, eu ainda mais: circuncidado no oitavo dia de vida, filho da descendência de Israel, da tribo de Benjamim, hebreu de hebreus; quanto à Lei, fui fariseu; quanto ao zelo, persegui a Igreja; quanto à justiça que há na Lei, eu era irrepreensível.” (Filipenses 3, 4)
5 modos de cair na armadilha do legalismo
Nesse trecho citado acima, Paulo nos mostra 5 maneiras de cair na armadilha do legalismo:
Legalismo é colocar a confiança nos rituais
«Circuncidado no oitavo dia de vida»
Hoje você encontra pessoas que se orgulham de terem sido batizadas em uma catedral importante, ou por terem recebido a primeira comunhão do próprio Papa ou de um Cardeal, e se acham santas e justificadas por isso. Isso é cair no legalismo.
Os rituais ajudam, são meios, mas não coloquemos nossa justificação nisso. Aqui nós podemos citar como exemplo, também, os «católicos de IBGE», aqueles que são católicos somente de estatística. Acham que por terem sido batizados já está tudo bem.
Legalismo é colocar a confiança na linhagem ou tradição
«Filho da descendência de Israel, da tribo de Benjamim»
É aquele católico que deposita sua fé no fato da avó que rezava o terço todos os dias, ou aquele tio que era um santo. São aqueles católicos que têm orgulho de serem de uma linhagem de bons católicos, mas sentem-se justificados somente por isso. «Cada um tem que conseguir sua própria santidade, com seus próprios esforços, com seus próprios méritos».
Legalismo é colocar nossa confiança apenas nas Instituições
«Hebreu de hebreus»
Paulo poderia se sentir santificado só por ser membro do povo de Israel. Hoje nós encontramos isso também. Há católicos que se sentem justificados por serem membros de grupos, movimentos, ou por serem membros da própria instituição Igreja. «Não basta a pertença formal, isso não nos salva», recorda o Pe. Rodrigo.
Legalismo é colocar nossa confiança nas regras
«Quanto à Lei, fui fariseu»
«Paulo era da elite espiritual de Israel», explica o padre. Essa é a maneira mais frequente em que os católicos caem no legalismo. Contudo, Pe. Rodrigo recorda que regras são meios. Deus tinha deixado a Moisés 10 mandamentos. Os fariseus converteram em 613 regras. «Eles pegavam os mandamentos e faziam toda uma interpretação de cada mandamento». «Vão criando novas regras para serem fiéis aos primeiros mandamentos».
«No final, o relacionamento com Deus não existe». O próprio Jesus criticará isso. Nessa passagem de hoje, vemos que Marcos explica como que os judeus têm que lavar os copos, as jarras e as vasilhas, e o próprio Jesus diz que não adiantava o culto que os fariseus prestavam a Deus, pois suas doutrinas eram preceitos humanos. «Inventaram tantos mandamentos que, ao final, esses mandamentos acabavam por até negar os mandamentos principais».
Legalismo é colocar sua confiança na reputação
«Quanto ao zelo, persegui a Igreja; quanto à justiça que há na Lei, eu era irrepreensível».
Os cristãos eram perseguidos por Paulo, não porque ele fosse ateu. Pelo contrário, eles eram perseguidos porque Paulo era tão observante da lei que pensava que os cristãos ensinavam a não respeitar a lei. E Paulo se vangloriava de sua reputação de perseguidor de cristãos.
Em resumo, o legalismo é substituir nossa relação com Deus pelas regras, pelas normais, pelos rituais.
O que fazer para não cair no legalismo
“Dais o dízimo da hortelã, do endro e do cominho, mas tendes descuidado dos preceitos mais importantes da Lei: a justiça, a misericórdia e a fé. Deveis, sim, praticar estes preceitos, sem omitir aqueles!”
Mateus 23, 23
Nesse trecho do Evangelho de Mateus, Jesus fala precisamente aos fariseus o que é preciso fazer. «É muito clara a mensagem de Jesus. Os ritos, as normas, as regras, em si mesmo, não são maus, se nós não perdemos de vista o essencial, nossa relação com Deus», continua o Pe. Rodrigo.
Como sei que estou caindo no legalismo?
Em primeiro lugar, eu perco a felicidade. Quando caímos no legalismo ficamos angustiados, estamos sempre preocupados e perdemos a espontaneidade, a liberdade. «O legalismo é o desmancha-prazeres da fé».
O segundo sinal de estarmos caindo no legalismo é que nós perdemos a iniciativa. «A frase mais típica de um legalista é ‘Não pode fazer isso’». E, em terceiro lugar, se perde o calor das relações verdadeiras. Parece que tudo são normas e o relacionamento humano se perde.
O que torna o homem impuro
A partir de então, Jesus começa a explicar sua doutrina sobre a impureza e pecado. «Essas palavras simples de Jesus vão provocar uma verdadeira revolução na história da religião judaica e, eu diria, de todas as religiões, de toda história, do mundo», afirma o Pe. Rodrigo. «Jesus coloca o foco principalmente no amor, na intenção».
Ele ensina 3 coisas. Primeiro, que todas as coisas materiais não podem fazer o homem impuro. «Isto é uma coisa muito forte, pois é uma desmitificação do mundo. A tradição cristã que desmitifica o universo».
Em segundo lugar, declara que a única coisa que pode tornar o homem impuro é o pecado. E, em terceiro lugar, o pecado depende da intenção.
Falar de pecado não está fora de moda
Alguns diriam que falar de pecado está fora de moda. É melhor falar de erros. «Mas, pecado e erro são duas coisas bem diferentes, porque o pecado inclui a intenção», explica o Pe. Rodrigo.
O pecado, em sentido estrito, precisa ter 4 momentos. Em primeiro lugar vem a Tentação, quando, por exemplo, alguém me ofende e eu sou tentado a reagir, a me vingar. Num segundo momento, eu fico pensando se vou ou não me vingar, se devo ou não fazer e aí se dá a Deliberação.
Num terceiro momento, depois de ter deliberado, eu decido me vingar. Darei um basta naquela pessoa para que ela aprenda. Aí, portanto, se dá a Decisão. E, por fim, no quarto momento, temos a Execução, propriamente dita. Vou e cometo o pecado.
Contudo, imaginemos o mesmo exemplo da pessoa que é ofendida e imediatamente reage, sem sequer deliberar, sem decidir. Simplesmente reage por impulsividade. Isso não é pecado, mas é aquilo que chamamos de imperfeição, que também deve ser corrigida, mas não é um pecado em si, pois faltou a intenção.
Agora, por outro lado, imaginemos que falte a Execução. Alguém me ofende, sou tentado a me vingar, delibero, decido-me pela vingança, mas não executei porque a pessoa foi morar em outra cidade, ou outro motivo qualquer. Isso é pecado, porque tomei a decisão de me vingar. Não é tão grave quanto se houvera executado, mas só o fato de tomar a decisão já nos coloca em pecado.
Por fim, Pe. Rodrigo encerra sua homilia recordando que «Deus tinha dado 10 mandamentos a Moisés. Os judeus, pelo legalismo, transformaram esses 10 mandamentos em 613 mandamentos. Jesus, finalmente, resumiu toda sua doutrina num único mandamento: o amor».
E Ele fez isso porque o mandamento do amor é justamente a intenção. Se eu atuo movido pelo amor, então, nada vai ser impuro para mim, e para explicar isso, o padre trouxe um ensinamento de Santo Agostinho, que a Igreja comemorou no sábado passado:
“Ama e faz o que quiseres. Se calares, calarás com amor; se gritares, gritarás com amor; se corrigires, corrigirás com amor; se perdoares, perdoarás com amor. Se tiveres o amor enraizado em ti, nenhuma coisa senão o amor serão os teus frutos.”
Santo Agostinho, Homilia sobre a Epístola de São João
- Pe. Rodrigo Hurtado LC transmite a celebração da Santa Missa, ao vivo, todo domingo, às 18h, em seu canal do YouTube. Não deixe de se inscrever no canal, deixar seu like nos vídeos e compartilhar.