Manipulação da linguagem
“A Revolução estará completa quando a linguagem for perfeita. (…) o processo continuará avançando até muito tempo depois que você e eu estivermos mortos. Menos e menos palavras a cada ano que passa, e a consciência com um alcance cada vez menor” (George Orwell in 1984. 2013, p. 69)
A linguagem é um dom dado por Deus ao Homem para que ele possa comunicar-se com os seus semelhantes e com o Próprio Deus. Dotado desta capacidade comunicativa, o ser humano é capaz de elaborar complexas sentenças de pensamento, expressar aquilo que sente, pensa e deseja.
É através da linguagem que entoamos a Deus louvores, cânticos, salmodias, poemas, porque somos seres capazes de comunicação, nos relacionamos com Deus de forma íntima e profunda.
Ao mesmo tempo que é um dom, por causa do Pecado Original, tornou-se também um instrumento de divisão, opressão e dominação.
No romance distópico 1984, o escritor inglês George Orwell trata de um mundo futurista (o romance foi escrito em 1948 e publicado em 1949), pós 2ª Guerra, dominado por 3 forças políticas. O personagem principal Winston vive na Oceânia, um dos continentes dominados por uma dessas forças hegemônicas.
Controlada pela figura do Grande Irmão, os habitantes da Oceânia vivem em constante estado de vigilância psicológica, tecnológica e linguística. Com o slogam “O Grande Irmão está de olho em você”, os líderes do Socing – o Partido único e dominante – controlam a todos por meio do medo e do ódio. Todas as pessoas são controladas e vigiadas constantemente. Cada indivíduo tem em sua casa uma “Teletela”, por onde o Partido inspeciona o que fazem, falam e pensam.
As teletelas e o controle da linguagem
Atualmente todos nós trazemos uma teletela conosco, certamente você está lendo este artigo por meio dela…
Temos presenciado atualmente um acirrado debate acerca do suposto gênero neutro, tenho certeza que você já deve ter lido ou visto vídeos sobre esse assunto, onde um certo movimento de minorias quer estabelecer a sua “Novilíngua” por meio de discursos ora vitimizados, ora violentos e opressores.
Segundo este determinado grupo, que tem conseguido influenciar uma parcela significativa da população – principalmente os jovens – com o seu gênero neutro, para que haja “equidade” entre os “gêneros sexuais”, já não se deve mais utilizar o masculino ou o feminino, ou seja, tudo é neutro. Aquilo que era ELE/ ELA se torna ILE, quando você direcionar-se aos seus amigos deve dizer AMIGUES, pois entre “iles” pode haver alguém que não se identifique com o seu sexo biológico, ou seja, com o seu gênero.
Desta forma aqueles que insistirem em não “normatizar” o gênero neutro são logo taxados de preconceituosos, retrógrados, conservadores e outros predicativos pejorativos. Se isso acontecer em suas redes sociais, certamente você sofrerá a ação dos “haters” e será vítima do tal “cancelamento”.
Este é um exemplo bem atual de como, através da manipulação da linguagem por meio das redes sociais, programas de televisão, séries, filmes, ou seja, através das teletelas a transformação das consciências acontece.
Reduzir a força das palavras, fazendo-as perder o seu real significado até que elas desapareçam
“Toda redução era um ganho, de vez que quanto menor fosse a possibilidade de escolha, mais tênue seria a propensão ao pensamento” (ORWELL, 2013,p. 358.).
Para que haja uma mudança no pensamento e na cultura, deve-se começar pela linguagem. Dominar a linguagem para transformar o senso comum, fazer com que aquilo que antes era considerado imoral seja agora visto como algo aceito e moral, ao ponto de ser tomado como um direito que sobrepõe-se a todos os outros direitos.
Um outro exemplo dessa manipulação do pensamento através da linguagem é o fato de que em alguns documentos já não se usa mais “Pai” e “Mãe” no campo filiação. A substituição por “genitor 1” e “genitor 2”, apesar de parecer algo democrático e igualitário, diminui a força lexical das palavras “pai” e “mãe”.
Tal substituição pretende, de forma gradual, fazer desaparecer estes termos e, junto com eles, ser esvaziada e extinta toda a força semântica das palavras “pai” e “mãe”. Caso isso aconteça, as relações familiares (outra palavra que aos poucos tem sido esvaziada) serão relativizadas a ponto de nem mais serem mencionadas.
Claro que aqui tenho tratado de casos extremos (não menos importantes e nada fictícios, apesar de usar a Literatura como “muleta” argumentativa.) no tocante à manipulação do pensamento.
Por que querem manipular o meu pensamento e minha linguagem?
Desde sempre fomos bombardeados de informações e imperativos por meio dos anúncios, parafraseando uma cantora de Rock dos anos 2000:
“Pense, fale, compre, beba, leia, vote, não se esqueça. Use, seja, ouça, diga. Tenha, gaste, more, viva.
(Pitty in Admirável chip novo. Deckdisc, 2003)
Somos a todo tempo impelidos ao consumo exacerbado e a padrões de vida que não refletem a nossa realidade ontológica.
Através da manipulação da linguagem vamos nos tornando seres automatizados, que é totalmente diferente de seres autônomos, sem uma identidade própria, apenas uma identificação utilitária para uma realidade autoritária.
“Sereis como deuses”, disse a Serpente a Adão e Eva no Jardim. Mesmo tendo sido criados à Imagem e Semelhança de Deus, ainda assim a Serpente conseguiu, por meio da linguagem, induzi-los à desobediência. Aqueles que já eram “como Deus”, por participação enquanto Deus o É por natureza, como afirma S. João da Cruz, foram ludibriados em uma realidade da qual eles já participavam.
Para que se mantenha uma estrutura de poder e dominação é preciso que haja dominados.
A verdadeira educação é o antídoto para a dominação da linguagem
É perceptível a queda da qualidade educacional em nosso País. Infelizmente somos uma massa de analfabetos funcionais, que sabem apenas identificar os códigos, mas são incapazes de decifrar aquilo que os códigos linguísticos expressam.
Existe hoje uma corrente que se orgulha da ignorância, que desdenha da Literatura e se gaba de nunca ter lido um livro. Julgando-se livres e superiores, são os escravos da Ditadura do Relativismo, como bem disse Bento XVI na Encíclica Deus charitas est.
Vivendo apenas para saciar os seus sentidos, essas pessoas não tem tempo para a reflexão, não refletindo apenas obedecem aos apelos sensoriais e às vozes que lhes direcionam para tal.
Mas não nos enganemos acreditando que isso aconteça somente com essa parcela da sociedade, isso também tem acontecido em nosso âmbito educacional. Cada vez mais distantes de uma verdadeira educação que conduz o indivíduo ao Belo, Único e Verdadeiro, fomos, durante décadas, bombardeados por pedagogias muito mais revolucionárias do que educacionais.
É-nos imposto um currículo que pouco atende às verdadeiras necessidades educacionais como afirma o filósofo esloveno Slavoj Žižek: “conhecemos a situação comum da escolha forçada em que estou livre para escolher com a condição de fazer a escolha certa, de modo que a única coisa que me resta é o gesto vazio de fingir realizar livremente o que o conhecimento especializado me impôs” (Como ler Lacan. Tradução Maria Luiza X. de A. Borges. Rio de Janeiro: Zahar,2010.), somos obrigados a seguir essa “escolha” forçada.
Como pai, esta é uma realidade preocupante. Como educar a minhas filhas, e também a mim, para não que não sejam manipuladas por uma linguagem que a todo tempo rejeita os valores basilares que fundamentam a liberdade?
A educação é o caminho! A verdadeira educação, não a educação terceirizada, mas a educação em primeira pessoa, ou seja, como pai devo ser o primeiro exemplo educacional dos meus filhos. Se quero que eles leiam os clássicos, que eles me vejam lendo os clássicos; Este é apenas um exemplo da educação pelo exemplo.
Devemos sempre acreditar na educação, ela é o caminho para a liberdade! Mas antes precisamos saber reconhecer a linguagem. Saber perceber se estamos sendo de fato manipulados ou não.
Termino este texto com uma citação do filósofo Marxista Antônio Gramsci, um dos expoentes teóricos da revolução cultural, e que define muito bem o tema aqui exposto:
“A realidade está definida com palavras. Portanto, quem controla as palavras controla a realidade”.