Em sua homilia desse Domingo, Pe. Rodrigo Hurtado medita sobre o matrimônio e os propósitos que originalmente Deus traçou para o relacionamento entre o homem e a mulher, e como podemos transformar nosso matrimônio numa realidade mais próxima dos planos de Deus para o casamento.

Hoje, claramente, o tema da liturgia é o matrimônio. Os fariseus introduzem o tema no diálogo com Jesus a partir de um ponto de vista negativo. Eles perguntaram para Jesus se podem repudiar a mulher. O divórcio é ruim, mas repúdio era algo muito pior do que o divórcio que nós conhecemos hoje. A mulher repudiada recebia quase que um estigma.

Havia duas interpretações sobre o repúdio naquela época. Na primeira interpretação, o homem podia repudiar a mulher por qualquer motivo. A outra corrente entendia que só se poderia repudiar a mulher se ela cometesse uma falha grave contra a lei de Moisés. Os fariseus levaram esse tema a Jesus, que dá uma resposta «politicamente incorreta para sua época, completamente contra-cultural e, eu diria, inclusive, fora desse mundo», diz o Pe. Rodrigo. 

Primeiro, Jesus fala que Moisés permitiu isso pela dureza do coração dos judeus. Moisés tolerava o repúdio, mas ele não queria isso. Em segundo lugar, Jesus condena o repúdio e estabelece o matrimônio para toda a vida e isso fez os fariseus e os próprios discípulos ficarem assustados. E, a terceira coisa, Jesus recorda que, desde o começo da criação, Deus estabeleceu o matrimônio.

Ao lermos esse texto do Evangelho de Marcos, vemos que não foi Jesus quem estabeleceu o matrimônio com sua vinda. Em certo sentido, era anterior a Jesus e já estava estabelecido desde o início da criação. «Ou seja, o matrimônio é parte do projeto de Deus, do plano de Deus para a criação», explica o Pe. Rodrigo.

Hoje, tristemente, o matrimônio é criticado, é banalizado, é ridicularizado, é distorcido… às vezes, as pessoas enxergam o matrimônio mais como um problema, um empecilho do que como uma graça. Isso acontece, segundo o Pe. Rodrigo, porque não compreendemos o projeto, o plano original de Deus para o homem e para a mulher que era o matrimônio. 

Na Carta aos Hebreus há um texto que diz que «o casamento seja honrado por todos» (Hb 13, 4). Hoje, o casamento não é honrado, porque já perdemos a capacidade de entender esse projeto. 

Nessa reflexão, portanto, o Pe. Rodrigo buscará mostrar o plano original de Deus para o matrimônio, o que Deus buscava ao estabelecer o matrimônio entre os seres humanos. O padre irá falar sobre seis propósitos que Deus tinha para a união entre homem e mulher. 

1. O matrimônio existe para nos complementar

Homens e mulheres são diferentes e isso é muito evidente. No relato da criação, ilustrado no livro do Gênesis, após Deus criar cada coisa, ele vê que é muito bom, mas ao olhar para o homem, sozinho, Ele diz que não é muito bom que o homem esteja só. S. Paulo, ao escrever aos Coríntios (1Cor 11, 11), revela que «no plano do Senhor, a mulher não é independente do homem, nem o homem é independente da mulher».

Nos tempos atuais, constata o Pe. Rodrigo, se luta muito para que o homem e a mulheres seja independentes uns dos outros, mas, ao contrário, Deus nos criou para sermos complementares. Essa tendência de homens e mulheres lutarem uns contra os outros para serem independentes se chama machismo ou feminismo, e ambos estão mal, distorcem o plano de Deus, são consequências do pecado original. Não é isso que Deus quer. Ele quer complementariedade. 

As diferenças entre os homens e as mulheres são feitas assim por Deus, justamente para se complementarem. Se o homem não se complementa à mulher, ele perde algo e, igualmente, se a mulher não se complementa ao homem, ela também perde algo.

Pe. Rodrigo explica que, mesmo os sacerdotes, que não são casados, precisam de uma comunhão espiritual com a comunidade de maneira que possam enriquecer sua personalidade com os pontos de vista e as riquezas da mulher. Também a mulher, religiosa, que não se casa, precisa igualmente. Essa é a natureza das coisas.

2. O matrimônio existe para criar o amor verdadeiro. 

Hoje vemos em músicas, filmes, livros, enfim, na sociedade em geral que tudo ganha o nome de amor, mas não é qualquer beijo que é amor. Amor verdadeiro exige sacrifício. Amor não é aquele que diz «eu amo você, porque você me faz feliz». Veja quanto egoísmo há nessa frase.

Amor é dizer «eu amo você, porque eu quero fazer você feliz». É aí onde se aprende o amor verdadeiro, precisamente nessa convivência diária e nesse sacrifício que implica construir um projeto juntos de uma família.

São Paulo, no capítulo 13 da primeira carta aos Coríntios escreve sobre o amor. É o texto preferido das noivas para a celebração de seu casamento. Nesse texto, S. Paulo escreve que o amor é paciente, o amor é bondoso, não tem inveja, não se vangloria, nem é arrogante, não se porta de maneira inconveniente, não age egoisticamente, não se enfurece facilmente, não guarda ressentimentos. O amor não se alegra com a injustiça, pois sua felicidade está na verdade. Tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta.

Apenas nesse parágrafo, Paulo menciona 15 jeitos ou maneiras de amar e nenhuma delas é fácil. Amar não é apenas dar um beijo, amar é realmente sacrificar-se, buscar a felicidade do outro e o matrimônio, recorda o Pe. Rodrigo, é um verdadeiro laboratório para aprender a amar, uma academia para aprender a amar. 

3. O matrimônio existe para povoar a terra e o céu

Esse é o ponto mais evidente, segundo o padre. Todos nascemos de uma família, então sabemos que a família é o lugar natural para popular a terra, mas não apenas nesse sentido prático. Ao contrário, o matrimônio construído sobre o amor é o lugar adequado também para o desenvolvimento dos filhos.

Na narrativa da criação, no Gênesis, Deus dá uma ordem ao homem e à mulher para que frutificar, multiplicar e encher a terra. Essa ordem contida em Gênesis 1, 28 é precisamente o primeiro mandamento de Deus, dado muito antes dos mandamentos de Moisés. 

Mas, a missão dos pais não acaba somente no popular a terra. Deus quer que nós povoemos também o céu. Há um texto de Malaquias (cap. 2, ver. 15) em que ele fala que «Deus desejava uma descendência consagrada». Deus não queria somente povoar a terra, mas Ele queria que povoássemos o céu, portanto a missão dos pais é fazer dos filhos verdadeiros discípulos do Senhor, que conheçam e amem a Jesus, para que um dia para que um dia, toda a família possa se reunir no Reino dos Céus.

4. O matrimônio existe para a proteção dos filhos

Hoje, reforça o Pe. Rodrigo, «se fala muito sobre o direito de ter filhos, mas esse direito não existe, porque ninguém tem o direito sobre a vida de outra pessoa». O que existe é o direito dos filhos de terem pais que os amam, porque esse era o plano original de Deus e porque esse é o lugar adequado onde eles podem crescer e se desenvolver. Isso não é defendido somente pela Igreja como está demonstrado em muitas pesquisas. 

O projeto de Deus é o melhor de todos. É melhor do que tudo aquilo que possamos querer inventar. Temos que lutar pelo projeto original de Deus. Esse modelo de família que Deus criou.

Se temos famílias bem estruturadas e mais sadias, a sociedade é  mais sadia e mais feliz. Aí onde temos famílias destruídas, corrompidas, a sociedade também se corrompe.

5. O matrimônio existe para formar o caráter

Nós, quando nascemos somos muito egoístas. Um bebê só pensa em si e em suas necessidades e, à medida que vai crescendo, precisa amadurecer. Isso significa que deveria ser capaz de entre que a vida não é sobre mim e sobre meus interesses, sobre minhas necessidades, mas eu estou aqui para servir as outras pessoas. Eu servindo é que encontro a minha felicidade, a minha realização. 

O matrimônio é uma escola muito boa para aprender o desprendimento. Não pensar só em mim, mas pensar também no meu cônjuge, aprender a ver o mundo através dos olhos dele ou dela. «Isso é parte do plano de Deus», reforça o Pe. Rodrigo.

São Paulo fala em sua carta aos Gálatas: «Levai as cargas pesadas uns dos outros e assim estareis cumprindo a Lei de Cristo» (Gl 6, 2). O matrimônio é precisamente isso, levar a carga do outro. Tanto as dificuldades como as limitações de um ou do outro cônjuge.

6. O matrimônio existe para refletir o amor de Deus

Até agora foi falado como o matrimônio era bom para os esposos, como o matrimônio é bom para os filhos, como o matrimônio é bom para a sociedade… Já «esse propósito de Deus é mais teológico, é mais abstrato, mas é muito bonito e é profundo», afirma o Pe. Rodrigo.

Paulo fala disso na Carta aos Efésios:

«Maridos, amai vossa mulheres, como também Cristo amou a Igreja, e a si mesmo se entregou por ela […] para a apresentar a si mesmo Igreja gloriosa, sem mácula, nem ruga, nem coisa semelhante, mas santa e irrepreensível»

Efésios 5, 25

Paulo começa comparando o amor dos maridos por suas esposas com o amor de Cristo pela Igreja. Os esposos devem amar como Cristo que morreu pela Igreja, é esse tipo de amor que deveríamos ter segundo S. Paulo. No versículo 30, do mesmo texto de Paulo, ele complementa dizendo que o fato do amor dos esposos refletir o amor de Deus é um «grande mistério». 

Isso significa que não existe outro amor que reflita melhor o amor de Deus por nós do que o amor dos esposos. Porque os esposos são duas pessoas desconhecidas uma da outra, duas pessoas diferentes, que vêm de família diferentes, parece que não têm nada em comum e logo se encontram, eles se apaixonam e entregam a vida um para o outro para partilhar e construir um projeto juntos. Foi isso que Deus fez conosco, Ele se apaixonou por nós.

Portanto, vejam como o projeto original de Deus era muito bom. É esse projeto que devemos tentar reproduzir em nosso matrimônio e, mesmo que não estejamos vivendo isso, não podemos desistir de tentar pois, «se realizamos o projeto de Deus em sua vida, seu casamento será como a ante-sala do céu. Acredite!» E nós podemos fazer isso porque contamos com a ajuda de Deus.

«Amai uns aos outros com todo o coração»

1 Pedro 1, 22

Esse é o segredo do matrimônio feliz. Mas como fazemos isso? Como amar com todo o coração?

1. Se queremos amar com todo o coração, temos que escutar com todo o coração.

Quando temos algum problema ou alguma dificuldade, ao invés de querer escutar. Nós queremos falar, queremos repetir mil vezes nosso pensamento, nossas coisas ao invés de escutar o que o outro tem para dizer. 

Temos que aprender a escutar não somente as palavras da outra pessoa, mas também escutar os sentimentos dela. 

2. Se queremos amar com todo o coração, precisamos perdoar com todo o coração

Quando passamos do limite, pelo calor do momento, e ofendemos o outro, temos que voltar atrás, pedir perdão e perdoar. Temos que fazer isso continuamente, todos os dias. Nunca deixar que se acumulem grandes problemas.

Às vezes não se trata nem de perdoar, mas de aceitar as diferenças do outro. (Rm 15, 7)

3. Se queremos amar com todo o coração, devemos ser vulnerável com todo o coração

Isso significa abrir o coração e reconhecer os erros. No matrimonio não se trata de competição, mas de humildade para reconhecer os erros. 

4. Se queremos amar com todo o coração, devemos amar a Deus com todo o coração

Jesus falava de amar a Deus com todo coração, com toda a alma e com todas as forças. Quando nós amamos a Deus com todo coração, isso nos ajuda em nosso matrimônio. Porque Ele criou você, Ele criou sua esposa ou seu esposo, Ele criou o casamento, então, Deus é o primeiro interessado em que isso dê certo e Ele vai dar as graças para isso aconteça. Uma belíssima e antiga alegoria sobre o casamento diz que o matrimônio não é entre duas pessoas, mas entre três. O marido, a mulher e Deus. 

Ao terminar, O Pe. Rodrigo recorda que no aplicativo Seedtime, há uma playlist com várias séries de meditações que se chama O Desafio do Amor, justamente falando do matrimônio. Ele convida aos casados a baixarem o aplicativo gratuitamente e fazerem uma meditação dessas a cada dia para seu casamento chegue mais próximo àquele plano que originalmente Deus tinha para nós.

  • O Padre Rodrigo Hurtado LC transmite a celebração da Missa todos os domingos, às 18h, através de seu canal do Youtube.