Pelo que vale a pena lutar
Em sua homilia da Solenidade de S. Pedro e S. Paulo, Pe. Rodrigo Hurtado LC nos revela esses dois grandes combatentes da fé e nos ensina sobre qual batalha realmente vale a pena lutar.
Pe. Rodrigo lembra que, quando estamos na escola, aprendemos sobre grandes batalhas da história, a batalha de Maratona entre gregos e persas, a batalha de Lepanto, entre cristãos e muçulmanos, o cerco de Orleans e a história de Santa Joana D’Arc, a batalha de Waterloo, a batalha de Stalingrado, entre Alemanha e Rússia, o desembarque da Normandia, entre outras.
Inclusive, ressalta o padre, que em 5 mil anos de história da humanidade, temos apenas uns 300 anos de paz, isto é, não somos muito bons em manter a paz.
Na própria Bíblia se encontram narradas muitas batalhas. Há até mesmo um livro dedicado quase exclusivamente às batalhas de Israel. O livro de Josué narra todas as batalhas que os judeus tiveram que enfrentar para conquistar a terra prometida. E ainda há uma guerra que está narrada na Bíblia que acontecerá no fim dos tempos, o Armagedon.
Mas não existem apenas as batalhas militares entre países ou exércitos. Também existem as batalhas pessoais. Uma das experiências mais universais da vida é a luta. Desde que somos crianças temos que fazer grandes sacrifícios para aprender e progredir em tudo.
E não existem apenas batalhas fora de nós, também existem batalhas dentro de nós. Essas são batalhas que só nós podemos lutar.
E hoje que celebramos São Pedro e São Paulo, estamos lembrando dois grandes apóstolos que lutaram no início da Igreja para levar a mensagem de Jesus ao coração do Império Romano. E acabaram ambos sendo mártires da fé. Por isso, São Paulo hoje, começa a segunda leitura falando de um “combate”:
“Combati o bom combate, completei a corrida, guardei a fé. Agora está reservada para mim a coroa da justiça, que o Senhor, justo juiz, me dará naquele dia; e não somente a mim, mas também a todos os que esperam com amor a sua manifestação gloriosa.”
(2 Timóteo 4, 7)
As duas imagens mais usadas na bíblia para falar do cristão são o atleta e o soldado. Paulo usa as duas imagens, mas neste texto famoso ele se vê como um soldado cumprindo sua missão. A vida para São Paulo é uma batalha.
O Pe. Rodrigo destaca a frase de Paulo: «combati o bom combate». Isto é, existem batalhas boas e outras ruins. Existem batalhas pelas quais vale a pena lutar e outras que não.
“Nossa luta não é contra seres humanos, e sim contra principados e potestades, contra os dominadores deste sistema mundial em trevas, contra as forças espirituais do mal.”
(Efésios 6, 12)
Pe. Rodrigo recorda o famoso filme Star Wars. «Eu não acho que Star Wars tenha muita profundidade teológica, mas nisto eles acertaram: temos que lutar contra o “lado negro da força”». Esse lado negro está dentro de nós. É dentro de nós que temos a maior das lutas entre o bem e o mal, entre as boas intenções e as más ações, podemos nos deixar influenciar pelo bem que há em nós ou pelo mal que também está dentro de nós.
As 3 maiores batalhas
A batalha entre o amor e o egoísmo
Eu posso viver para mim mesmo ou posso viver por Deus e para benefício dos outros. Esta é uma batalha permanente dentro de nós. Se nós aprendemos a vencer nesta batalha, nossa vida vai ser muito mais feliz e simples.
A maioria dos conflitos que encontramos na vida não são provocados por outros, mas sim, por nós mesmos e pelo nosso egoísmo. Isso é o que diz o apóstolo Tiago:
“De onde vêm as batalhas e os desentendimentos que há entre vós? De onde, senão das paixões que guerreiam dentro de vós.”
(Tiago 4, 1)
Os conflitos nascem de nosso interior, do jeito que reagimos às circunstâncias. Quanto mais amor e humildade nós tivermos, menos conflitos nós teremos que enfrentar.
Contudo, a humildade não é não valorizar-se, achar que não temos nenhum valor ou virtude, que todos são melhores que nós, que nós somos um lixo. humildade é pensar menos em nós. O humilde é meio que invisível a seus próprios olhos porque sempre está pensando nos outros, porque sempre tem os olhos nos outros ou em Deus.
“Nada façais por contenda ou por vanglória, mas com humildade cada um considere os outros superiores a si mesmo; não olhe cada um somente para o que é seu, mas cada qual também para o que é dos outros.”
(Filipenses 2, 3)
A batalha entre o perdão e o ressentimento
Nós vivemos num mundo desajustado e todos levamos essa batalha do egoísmo dentro de nós. O resultado é que vamos ser feridos, ofendidos e maltratados muitas vezes. Isso é um fato.
Nós podemos controlar como vamos responder a isso tudo. Podemos perdoar ou podemos guardar ressentimentos. Isso está completamente sob nosso controle.
O ressentimento não pode fazer dano a quem nos ofendeu, muitas vezes essas pessoas até esqueceram o episódio que nós guardamos com tanta dor.
“Vigiai para que ninguém se exclua da graça de Deus. Que nenhuma raiz de mágoa venenosa brote e vos perturbe e por ela muitos se contaminem.”
(Hebreus 12, 15)
O ressentimento sempre faz maior dano que a própria dor que a causa. Por isso, temos que enfrentar essa batalha e vencê-la.
“Irai-vos, mas não pequeis; não se ponha o sol sobre a vossa ira.”
(Efésios 4, 26)
Irar-se não é pecado. É simplesmente uma resposta emocional instintiva diante de determinadas circunstâncias. Muitas vezes existem causas justas para irar-se. A ira é evidência de amor. Mas irar-se pode chegar a ser pecado se nós guardamos ressentimento, se nós tentamos nos vingar, se nós criticamos e ofendemos com palavras.
Temos que aprender a lidar com o ressentimento e as mágoas. Essa é uma batalha difícil, mas muito importante em nossa vida.
A batalha entre o que é fácil e o que é correto
A cada dia temos que tomar a decisão entre fazer o que é mais fácil, mais cômodo, mais prazeroso e o que é correto, o que é meu dever, o que é necessário para avançar e crescer.
“A carne luta contra o Espírito, e o Espírito, contra a carne. Eles se opõem um ao outro, de modo que não conseguis fazer o que quereis.”
(Gálatas 5, 17)
Temos uma batalha interior. Sempre experimentamos a tendência a fazer o que é fácil, o que é gostoso, o que se sente bem. Realmente temos uma batalha interior. Entre o homem velho e o homem novo. O homem carnal e o homem espiritual.
Disciplina e Maturidade
A maturidade significa precisamente alcançar uma ordem nessa batalha interior, conseguir uma certa vitória do dever, do correto, da responsabilidade sobre o fácil, o desfrute imediato, as tendências caóticas de nossa natureza ferida pelo pecado.
A disciplina e o caráter são as virtudes que nos permitem ter controle nessa batalha interior. O padre deixa o exemplo dos pais que, ao estarem cansados, não formam a disciplina e caráter em seus filhos, deixando-os simplesmente diante de uma televisão, de um video-game, dando-lhes o que querem na hora que querem.
Curto prazo versus longo prazo
«É chato ter que disciplinar, claro que é!» – exclama Pe. Rodrigo. Mas é necessário formar essa disciplina e esse caráter quando ainda os filhos estão na etapa de desenvolvimento e formação.
“Não nos desfaleçamos de fazer o bem, pois, se não desistirmos, colheremos no tempo certo.”
(Gálatas 6, 9)
É a batalha entre o curto prazo e o longo prazo. O maior problema de nossa cultura moderna é o pensamento de curto prazo. Todos nossos problemas vêm da falta de habilidade para adiar o prazer imediato para conseguir um benefício maior a longo prazo.
Então esta é uma batalha muito importante a vencer em nossa própria vida. Temos que começar hoje para alcançar amanhã. Temos que sacrificar o curto prazo para alcançar o objetivo no longo prazo.
Armas que Deus nos deu para a luta
A Fé e a Palavra de Deus
Tudo começa por alimentar nossa fé, nossa espiritualidade, estudar a palavra de Deus. Sem isto não teremos forças para lutar. Não estamos sozinhos. Deus quer nos ajudar. Aqui entra a oração pessoal, o estudo da Sagrada Escritura, a busca da vontade de Deus.
Pe. Rodrigo, inclusive, nos recorda que temos muitas ferramentas para nos ajudar, até mesmo aplicativos, como o aplicativo de meditações Seedtime.
O Apoio da Igreja
A Igreja é muito importante, porque nós precisamos de alguém que nos diga: “Você está enganado”, “O correto não é isso”. A espiritualidade vivida apenas de forma privada cai na subjetividade.
O padre recorda as pessoas que estão vivendo em pecado, mas se acham muito próximas de Deus. Pessoas que estão no segundo ou terceiro divórcio, mas dizem “sentir” que estão perto de Deus. Jovens que podendo se casar, preferem apenas “ficar”, mas asseguram que amam muito a Deus. Pessoas que trapaceiam nos negócios, mas afirmam que são as pessoas mais santas que existem.
Obviamente que ninguém é perfeito, mas não é normal auto enganar-se, acreditar que os pecados não são importantes para Deus, que podemos ser boas pessoas apesar disso. E, muitas vezes, nos auto-enganamos porque os sentimentos mentem para nós.
Nós não somos o que gostaríamos de fazer, nós somos o que de fato fazemos. E Jesus é muito direto em relação a isso:
“Nem todo aquele que diz a mim: ‘Senhor, Senhor!’ entrará no Reino dos céus, mas somente o que faz a vontade de meu Pai, que está nos céus.”
(Mateus 7, 21)
Precisamos ser muito sinceros conosco mesmo. E para isso está a Igreja, com seu ensinamento, com pessoas que ajudam e aconselham, com os sacramentos que reparam os nossos pecados, que nos reconciliam com Deus e nos devolvem a graça.
O poder do Espírito Santo
Finalmente, contamos também com a graça do Espírito Santo. Lembremos que Jesus disse que ia nos enviar o Espírito Santo para ser nosso auxiliador e companheiro. Com Ele podemos e devemos contar.
Jesus dizia: “Convém a vós que eu vá embora”. Por quê? Porque Ele estava limitado nas condições espaço-temporais. Agora, o Espírito Santo não. Ele pode estar com cada um de nós, em cada momento da vida, em cada lugar da terra. Realmente nós contamos com essa ajuda que Jesus nos proporcionou?
Conclusão
Quando Paulo fala da luta, ele agrega um detalhe importante:
“Não corro como quem corre sem alvo, e não luto como quem apenas soca o ar.”
(1 Coríntios 9, 26)
Na mesma carta aos Coríntios Paulo diz:
“Entre todos os que correm no estádio, na verdade, somente um recebe o grande prêmio? Correi de tal maneira que o alcanceis!”
(1 Coríntios 9, 24)
Paulo não luta de qualquer jeito, ele luta para ganhar. A vida é uma batalha importante demais para desperdiçá-la, para enfrentá-la de qualquer jeito ou como se fosse uma brincadeira. Só temos uma vida e temos que correr ou lutar para ganhar.
Por isso, temos que aproveitar ao máximo as armas que Deus nos oferece e lutar, como diz São Paulo, como quem quer realmente ganhar.
- Assista a homilia completa do Pe. Rodrigo Hurtado LC com estudo bíblico no link abaixo.